Imagine a situação de você desejar adquirir um produto específico, ter se programado financeiramente para isso, mas no momento da aquisição é impossível adquirir esse produto sem levar para casa algo adicional, seja algum tipo de garantia extra ou até mesmo um produto acessório. Revoltante, não é mesmo?
Essa situação não é apenas desagradável ao consumidor, como também é uma prática condenável pela legislação específica. Isso mesmo, poucas pessoas sabem, mas o consumidor não é obrigado a concordar com a venda casada, sendo que o fornecedor do produto ou serviço deve oferecer alternativas.
Por certo que há uma infinidade de situações que podemos citar que configuram venda casada, por isso vamos destacar as características dessa modalidade de venda e como a jurisprudência sobre venda casada se comporta em situações dessa natureza.
O papel da jurisprudência nos casos de venda casada
Como se sabe, ainda que cada processo possua certas particularidades, é bem provável que uma situação bem parecida já tenha sido levada para discussão em juízo, ainda que com algumas distinções pontuais. É nesse cenário que encontramos a chamada jurisprudência e até mesmo os precedentes.
Com isso, o conjunto de decisões que seguem a mesma linha de raciocínio e a mesma interpretação a respeito de um tema – o que chamamos de jurisprudência – são fontes usuais no dia a dia da advocacia, sendo utilizado também como um elemento relevante para fundamentar decisões judiciais.
Essa costuma ser a estratégia de muitos advogados, sustentar teses jurídicas baseadas em ações parecidas que foram julgadas pelos tribunais pátrios, sendo um caminho válido para dar força a determinadas teses perante o Poder Judiciário.
Mas isso pode mudar alguma coisa na minha ação judicial? Qual a relevância para casos de venda casada?
A jurisprudência é um fator muito relevante a ser considerado em qualquer tipo de ação, pois espera-se que situações similares tenham também desfechos parecidos. Então se a parte que ajuíza a ação tem alguma expectativa relacionada ao tema discutido em juízo, é interessante que busque jurisprudências que mantenham relação com o caso. Importante destacar que a jurisprudência não vincula o juiz, mas ajuda a construir um entendimento a respeito de uma matéria específica.
Se há ampla jurisprudência a respeito de um mesmo tema e a parte a utiliza na sua tese, é necessário que quando da fundamentação da decisão o juiz justifique o porquê de decidir de maneira contrária à jurisprudência juntada, quais distinções no caso concreto justificam essa mudança de posicionamento. Mas mesmo em situações assim, não há vinculação das decisões, jurisprudência é questão de parâmetro.
Funcionando como parâmetro, é altamente indicado que a jurisprudência seja utilizada em teses que defendam a proibição da venda casada e possíveis punições na hipótese de ocorrência, ainda mais em ações em que haja certa similaridade entre as situações narradas.
Entendimento do STJ de jurisprudência sobre venda casada
Como já destacado, a prática da venda casada é vedada pela legislação consumerista e toda prática que vá contra essa ideia deve ser denunciada ao Procon e, caso seja a opção do consumidor lesado, levada a julgamento no Poder Judiciário.
Os tribunais superiores contam com diversos posicionamentos a respeito, tendo ampla jurisprudência sobre a temática. O STJ – Superior Tribunal de Justiça, corte superior aos tribunais estaduais no nosso ordenamento jurídico, já se manifestou a respeito do tema.
Poucos anos atrás surgiu uma problemática que era cotidiana de muitos brasileiros, os consumidores eram proibidos de entrar nas salas de cinema com alimentos adquiridos de outros estabelecimentos, só era possível consumir no interior das salas as guloseimas que eram vendidas na bomboniere do cinema.
A questão é que os consumidores já haviam pago para utilizar a sala de cinema, sendo vedado condicionar seu consumo de alimentos aos produtos adquiridos dessa rede de cinemas, acabando com a lógica de liberdade de escolha dos consumidores.
Nesse caso a questão da venda casada não parece tão explícita, mas ela está aí, é o que chamamos de venda casada dissimulada, onde há uma evidente limitação na liberdade de escolha dos consumidores, visto que há apenas uma escolha entre consumir o produto da bomboniere ou não consumir nada.
Essa questão foi levada a juízo e o STJ reconheceu a prática abusiva, formando um importante precedente a respeito do tema.
O que é venda casada?
Mas a dúvida que fica é, no que consiste a chamada venda casada?
Em linhas gerais, essa prática abusiva pode ser caracterizada pela conduta do prestador de serviço ou fornecedor de produtos de condicionar a compra de um produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, ainda que o consumidor não tenha manifestado interesse na compra conjunta.
Com isso, um produto acaba sendo atrelado a outro, não sendo possível adquirir nenhum dos dois isoladamente – nem o principal, nem o acessório – acabando com a liberdade de escolha do consumidor.
Note que aqui há a inclusão de um serviço ou produto que não foi solicitado por quem deseja adquirir, esbarrando também na boa-fé objetiva das negociações. Essa prática é uma velha conhecida dos brasileiros, como quando o consumidor é obrigado a obter um plano de telefonia juntamente com o plano de internet ou plano de TV a cabo.
• Direitos do Consumidor
O Código de Defesa do Consumidor assim denomina a venda casada:
“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;”
Nesse cenário, resta evidente que práticas dessa natureza vão contra o estipulado em lei, sendo certo que os fornecedores de produtos e serviços sejam responsabilizados por essa lesão ao consumidor.
A regra básica das relações consumeristas é que o consumidor tenha acesso a informações completas para que possa realizar suas transações de forma livre e consciente. Se a prática de algum estabelecimento ou fornecedor autônomo for contra essa lógica, o consumidor pode procurar seus direitos e denunciar essas práticas.
• Direitos do Fornecedor
Ainda que pareça estranho em um primeiro momento, os fornecedores também possuem direitos relacionados às práticas de consumo garantidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
O fornecedor de um produto ou serviço, por exemplo, só é obrigado a realizar a troca ou a devolução dos valores relacionados a um produto quando o mesmo é adquirido fora do estabelecimento comercial, por meio de compras pela internet ou telefone. Com isso, ele tem o direito de se negar a realizar a devolução fora do prazo estipulado, ainda que o consumidor seja a parte mais vulnerável da relação, deve se atentar a essas questões.
Além do mais, é direito do fornecedor a cobrança de multas e demais encargos pelo atraso no pagamento de algum produto ou serviço. Conhecer essas questões pode fazer muita diferença na prática diária, tendo em vista que o fornecedor sabe exatamente até onde pode ir em suas relações de consumo.
Exercer o direito de informação é um direito que pode beneficiar tanto o consumidor como o fornecedor, protegendo ambos de eventuais problemas de interpretação. No que concerne a venda casada, isso é essencial.
• Serviço Público e venda casada
A venda casada em serviços públicos foi palco de algumas discussões tempos atrás, levantando mais uma vez questões que estavam adormecidas. Como se sabe, alguns serviços essenciais estão condicionados ao pagamento de uma certa taxa mínima de uso, então ainda que o consumidor não consuma o mínimo, deverá pagar por ele.
A questão da prestação do serviço público condicionado ao pagamento da taxa mínima sempre foi ligado a mesma lógica das tarifas de telefonia, onde há a cobrança de um valor mínimo mensal, ainda que não utilizado. Analisando a lógica aplicada às relações de consumo mantidas pelas empresas de telefonia, o STJ – Superior Tribunal de Justiça reconheceu que é legítima a cobrança da tarifa básica.
A justificativa apresentada por aqueles que defendem que a cobrança de taxas mínimas em nada tem a ver com a venda casada é de que o não pagamento dessas taxas inviabilizaria a prestação desse serviço, sendo que as taxas são necessárias para a boa implementação dos serviços.
Considerando o julgamento equiparado das empresas de telefonia – que inclusive deu embasamento para a criação da súmula 356 – “É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa” – resta claro que o entendimento dos tribunais é no sentido de que não há que se falar em práticas abusivas no serviço público.
• Quando a venda casada é permitida?
É preciso destacar que nem todas as práticas de venda casada podem ser entendidas como práticas abusivas. Isso porque existem algumas situações em que a venda de um ou mais produto condicionada a compra de outro produto pode beneficiar o consumidor.
Imagine a situação de se dirigir ao mercado e ver a seguinte promoção: pague 2, leve 3. Não há como negar que a compra de um produto está condicionada a compra de um outro, mas essa prática pode ser encarada como uma oferta no caso de ser possível, também, adquirir apenas um produto isoladamente. Nesse caso não há nenhum comprometimento da liberdade de escolha do consumidor.
Jurisprudência sobre venda casada Favorável ao autor
A respeito do tema, é possível encontrar ampla jurisprudência, senão vejamos:
SEGURO PRESTAMISTA – Contrato de financiamento de veículo – Contratação conjunta – Ausência de facultatividade acerca da companhia contratada – Venda casada – Ocorrência: – Caracteriza venda casada a contratação de seguro prestamista, quando verificada impossibilidade de escolha acerca da empresa a ser contratada, sendo compelido a contratar empresa pertencente ao mesmo grupo econômico. (TJSP; Apelação Cível 1007935-10.2019.8.26.0002; Relator (a): Nelson Jorge Júnior; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 9ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/01/2020; Data de Registro: 20/01/2020)
RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – VENDA CASADA – SEGURO – AUSÊNCIA DE VOLUNTARIEDADE – SERVIÇO INADEQUADO – APLICAÇÃO DO CDC – DANO MORAL CARACTERIZADO – TEMA 972 STJ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Relação de consumo frente a instituição bancária. No primeiro grau, houve sentença julgando procedente o pedido indenizatório da requerente consumidora, ora recorrida, em razão de venda casada de seguro vinculado a empréstimo/financiamento bancário. 2. DECIDO. A sentença de primeiro grau merece ser mantida. O CDC é claro em seu art. 27 ao prever prazo prescricional de 5 anos. Ademais, a conduta do recorrente-fornecedor in casu revela-se abusiva, uma vez que trata-se de venda casada, instituto esse expressamente previsto no CDC, especificamente em seu art. 39, I. 3. O contrato objeto desta demanda é de natureza de adesão, possui a contratação casada de seguro, o qual apesar de constar em contrato, a recorrida não tinha voluntariedade na sua contratação. É incongruente que um “homem médio” nos termos jurídicos busque instituição financeira para “socorrer-lhe” financeiramente e, apesar de sua condição de hipossuficiência econômica saia de lá com mais um gasto, qual seja, a contratação de um seguro, onerando-se ainda mais. Logo, trata-se de prática de venda casada que é condenada pelo CDC (art. 39, I). 4. O prejuízo no caso trazido à lide advém da própria circunstância do ato lesivo em cobrar e forçar o pagamento de contrato acessório e obrigatório de seguro junto a outro contrato, sem direito de escolha ao consumidor, tal é ato ilícito devidamente denominado pelo CDC como prática abusiva, que possui, de acordo com a jurisprudência do STJ, a presunção de dano (Informativo nº 0553. Período: 11 de fevereiro de 2015. Segunda Turma. REsp 1.397.870-MG). Considero, portanto, preenchidos os requisitos do dano moral, presentes na conduta da má prestação do serviço pelo recorrente, com base nos arts. 20 e 39, I, do CD, além dos precedentes citados. (…) Condeno o recorrente a pagar custas e honorários de 20% sobre o valor da condenação do primeiro grau. (TJ-AM; Relator (a): Moacir Pereira Batista; Comarca: Manaus/AM; Órgão julgador: 3ª Turma Recursal; Data do julgamento: 27/01/2020; Data de registro: 27/01/2020)
CIVIL. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. CDC. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. TABELA PRICE. SEGURO DE VIDA. VENDA CASADA. MORA.(…) A exigência de pagamento de prêmio de seguro, que não se liga ao fim do contrato, configura espécie de venda casada, prática vedada pelo art. 39, inciso I do CDC. Ademais, destoa da razoabilidade presumir-se que o empresário necessitando de mútuo de dinheiro contrate também e na mesma data (ou em data próxima) seguro de vida em valor significativo. Aplicação ao caso das máximas da experiência (CPC, art. 375, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece) e inversão do ônus da prova para considerar que houve a venda casada de produto (seguro de vida) pela CEF. No caso, inexistente abusividade/ilegalidade no período de normalidade contratual, a mora e seus consectários ficam inalterados. A despeito da contratação abusiva de seguro de vida, por ser independente do contrato de mútuo, tal abusividade não interfere na mora deste contrato. (TRF-4, AC , Relator(a): , QUARTA TURMA, Julgado em: 29/01/2020, Publicado em: 31/01/2020)
Como usar jurisprudências sobre venda casada na estratégia de marketing jurídico
Utilizar situações dessa natureza para implementar seu marketing jurídico é uma ótima opção, tendo em vista que nada melhor do que a atuação em casos reais para passar confiança aos clientes. É certo que a clientela sempre busca profissionais que possam oferecer a maior segurança possível sobre a temática que tiveram problemas.
Se o profissional em questão demonstrar expertise no tema pelo qual foi procurado para atuar, maiores são as chances de uma possível contratação por parte do cliente. Com isso, produzir um conteúdo focando justamente em causas ganhas que tenham produzido jurisprudência pode ser um grande diferencial para o negócio.
Mas não apenas isso, demonstrar por meio das jurisprudências as reais chances de êxito em uma determinada ação pode ser muito bem visto por quem deseja contratar os serviços advocatícios, desde que o profissional atue com sinceridade e honestidade na amostragem.
Veja que não estamos falando de situações hipotéticas, é o verdadeiro trabalho realizado no dia a dia em destaque para demonstrar ao cliente o pleno domínio do fato em questão. Além de garantir autoridade ao profissional, a adoção dessa estratégia em marketing jurídico atrairá clientes que se encaixam perfeitamente no tipo de serviço ofertado.
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